domingo, 31 de maio de 2015

A MALA DE HANA


De volta ao meu tema favorito de leitura! Dessa vez venho falar sobre o livro "A mala de Hana", que tem como temática de fundo a segunda guerra mundial e as atrocidades que envolvem esse período trágico da humanidade. A partir da história de uma mala (de Hana), uma história de buscas e de descobertas se compõe! O livro se divide entre fatos ocorridos na Tchecoslováquia, Tóquio e Canadá. 

A mala - que se encontra em exposição em um centro de estudos sobre o holocausto, em Tóquio - leva Fumiko, a organizadora do centro de estudos, a investigar a vida da pequena Hana. E por aí se constrói a trama. O livro se faz de duas histórias que se entrelaçam e desenham em mosaicos de lágrimas, força e sorrisos os traços mais duros,  ternos e tênues da humanidade. 


Impossível não se comover com a história. Isso justifica a enorme vendagem da obra pelo mundo, seus diversos prêmios e a indicação do mesmo como leitura indispensável para jovens (de todas as idades!). Trata-se de uma leitura fluida, de fácil entendimento, de encaminhamento suave, apesar do tema, e que toca de modo direto e profundo a sensibilidade humana. 

Qualquer violência relacionada com crianças me soam atrozes! Assim, pensar que milhares de crianças foram mortas em nome de um desejo maquiavélico de poder, desperta revolta, dor e reflexões que giram em torno de: a que ponto o homem é capaz de chegar em nome do poder? Quantos sonhos deixaram de ser realizados? Quantas esperanças foram transformadas em cinzas? Hana tinha um desejo: ser professora...

Bom, a leitura é recomendadíssima! Ler, relembrar para que não mais ocorra! Para que nunca mais ocorra! 

Meus abraços,

Wagner Dias

sábado, 30 de maio de 2015

HOMENAGEM A MANOEL DE BARROS


CRÔNICA DOS PÉS DIREITOS


Wagner Teixeira Dias

Para a amiga Helenita Beserra, que me apresentou um poema e para todos os meus alunos do Colégio Estadual Guadalajara, de Duque de Caxias!

         Que a palavra tem força, eu nunca duvidei. Jamais tive dúvidas acerca do poder da literatura, da arte como elemento renovador, transformador. Arte toca nas fendas mais profundas, arte entra pelas crateras das chagas e atinge rapidamente a corrente sanguínea passando pelo coração, cérebro e todo o corpo. Em algum momento ela chega à mente. A palavra também faz esses percursos. De tanto que se fala sobre algo, algo em que se acredita, esse algo vai virando verdade e se tornando vida real e concreta.
         Falar disso tudo é coisa muito diferente de viver isso tudo. E comecei a ter essas vivências logo que uma amiga me apresentou um poema de Manoel de Barros[1] que fala sobre a importância das coisas. O poema indagava: “o que seria mais importante para o cachorro? Um osso ou um diamante?”.
 E após a apresentação do poema, a frase contundente: só nos relacionamos intimamente e com zelo, e com afeto, e com ternura com aquilo que nos é caro, importante. Importante! Essa é uma palavra que se repetia no poema do Manoel de Barros.
         No dia seguinte, modifiquei tudo o que eu faria com meus alunos em sala de aula. Abandonei as orações coordenadas, a estrutura da narrativa e passei o poema no quadro. Prevendo que os jovens reclamariam, fui logo avisando: “hoje vocês vão copiar apenas esse poema. Depois vamos dialogar. Cadernos, canetas, borrachas, lápis... tudo será devidamente guardado nas mochilas e vamos dissecar esse poema. Torná-lo vivo!” Entender algo, para mim, é dar vida!
E assim foi. Os alunos copiaram. Na sequência, sentaram-se em um semicírculo e me olharam com olhos hesitantes, tentando adivinhar o que eu pediria que fizessem. Eles temem as surpresas dos mestres. Ficam tensos. Trata-se daquela tensão que o aluno sente quando não sabe o perigo iminente que pode surgir da fala do professor, tão dono e cheio de si, tão e todo poderoso na regência da turma. E eu comecei a minha tagarelice. Falei da importância das coisas. Falei do zelo, das lembranças, das pessoas que amamos, das coisas que desejamos, de como cuidamos daquilo que valorizamos e de como tentamos proteger as pessoas que queremos bem.
Olhei para as carteiras rabiscadas e, pensando no fotógrafo-artista do poema de Manoel de Barros, mostrei aos alunos que poderíamos simplesmente fotografar uma carteira rabiscada, ou poderíamos ver importância nela. Podíamos ajustar as lentes para olhar para essa carteira, trocar o filtro, colocar mais ou menos cor, dependendo da medida da importância que a mesma tem para nós. Não foi preciso falar muito até que alguém disse, no fundo da sala: “rabiscamos a carteira porque ela não é importante para nós. É isso que o senhor quer ouvir, não é?”.
Acho que no fundo sim, era o que eu queria ouvir. Mas não apenas isso! Eu queria que os alunos compreendessem o que deveria ser a sala de aula para eles. Que não fosse a prisão que muitos desenhavam, nem a droga de sala de aula, repleta de drogas de paredes, cercada por outras drogas de corredores, drogas de salas, drogas de escadas... drogas de professores...
A tagarelice continuou. Evoquei minhas memórias de estudante. E escovei a contra pelo minha história, à Walter Benjamin, e disse aos alunos que um dia fui como eles. Que ainda que meus pais avisassem, eu não conseguia entender o porquê de a escola ser tão importante. Lembrei-me de um professor que me perguntou o que eu queria ser na vida. E eu não sabia o que eu queria ser na vida, todavia eu sabia o que queria ter na vida! Porém, o ter na vida dependeria do ser na vida! E nesse jogo de palavras, de ideias e de memórias, nessa angústia barroca, reconstruí minha história e revisitei o dia em que, após ter concluído o ensino médio, fui ao meu colégio buscar meu histórico escolar.
Lembrei-me de ter saído da secretaria feliz com o papel na mão. Aquele papel que comprovava que eu terminara o ensino médio e que estava apto a ir além – fazer uma faculdade, ou enfrentar o mundo do trabalho. Rememorei a saída da secretaria rumo ao portão. Olhei para trás e senti um vazio. Aquele papel que eu carregava nas mãos era a tesoura que cortava, naquele momento, meu cordão umbilical, meu elo com a placenta-escola. E à medida em que eu me aproximava do portão, um nó na garganta se mostrava vivo.
Eu não ouviria mais o sino, não ouviria as vozes, não sentiria o cheiro da merenda, não pisaria de novo, como aluno, aquele chão. Não teria mais aquela rotina... Como me faria falta aquela rotina!
Ao sair da escola, naquele dia, vi a vastidão do mundo, tal qual o bebê que acaba de nascer e que vê a luz pela primeira vez, que sorve o ar, que se incomoda com os ruídos, que se sente perdido. Eu não sabia para onde fugir e me bateu um desejo enorme de voltar para a escola, de bater com as duas mãos naquele portão e pedir socorro: “abram, por favor, preciso voltar. Não estou preparado para sair. Há muitas coisas que não aprendi! É mais confortável aí dentro. Como vou seguir sozinho?” E então, ouvi a voz do portão: “seu ciclo aqui se fechou! Agora siga!”.
E segui...
De volta ao presente e ao prazer da leitura de Manoel de Barros, percebi-me em sala de aula com alunos diante de mim em um silêncio profundo, mas contemplativo, aquele silêncio que atordoa de tanto barulho que faz. Voltei os olhos lacrimejantes para meus alunos que me ouviam com muita atenção, momento raro. E eu disse a eles: “ao sair daquele portão azul – víamos o portão pelas janelas do segundo andar do prédio da escola – vocês estarão caminhando para a realização dos sonhos. É bom entender que essa realização já começou. Vocês saem daqui, hoje, diferentes de ontem, diferentes do minuto anterior àquele em que pronunciei a palavra “anterior”. Quando saírem daqui, hoje, deem, lá no portão azul, o primeiro passo rumo à mudança de vida”.
Era meio-dia e encerrei a aula. Eles saíram apertando minha mão, com um brilho diferente no rosto. Como eram carentes de palavras! Eu senti que o poema do Manoel de Barros que a mim havia tocado, tocara também suas almas. A última frase do dia: “sua aula foi boa, professor!” E aquela simples frase, pronunciada por jovens de corações feridos pelas agruras da vida soaram como um “hoje fomos amados”! Eu me senti orgulhoso! Enchi meu coração de alegria, paz e esperança. Os alunos saíram, a sala de aula ficou silenciosa, vazia e empobrecida. Apaguei com dor na alma o poema, tão lindo, que estava escrito no quadro e fui guardar meus pertences na bolsa.
Despretensiosamente, ou instintivamente, ou por um empurrão divino, não sei, dei a última olhadela nos alunos que naquele dia tocaram meu coração de um modo ímpar. Lancei, da vidraça quebrada, os olhos no portão azul, lá embaixo. Vi que havia uma lentidão na saída. Aquilo não era usual, uma vez que ir embora era um desejo dos jovens. Havia uma pequena fila. Isso se devia ao tipo de passo que era dado por eles. Um a um, e comentando um com o outro sobre o que faziam naquele momento, eles colocavam para fora da escola, através do portão-portal azul, os pés direitos rumo à realização dos sonhos. Timidamente sorri, não acreditando na cena que via. Torci para que eles olhassem para a janela e me vissem a contemplá-los. O coração bateu mais forte, senti bater na garganta! Nenhum deles olhou para cima. Nenhum deles acenou, nem disse: “viu professor, a gente saiu com o pé direito”! Não precisava! Eu já me sentia realizado. Não deram aqueles passos para mim, mas para eles, como guinada para suas vidas tão plenas de dificuldades. Fizeram por eles. Deram o primeiro passo rumo à vastidão do mundo. Que sejam felizes!
Naquele dia de maio, mais que em outros, a poesia valera a pena!
E segui...
Desejoso de fazer versos...


Rio de Janeiro, 29 de maio de 2015.



[1] O poema aqui citado chama-se Sobre Importâncias
Fonte da foto da postagem: http://www.revistabula.com/2680-os-10-melhores-poemas-de-manoel-de-barros/ (acesso em 30 de maio de 2015)

sábado, 16 de maio de 2015

O CLUBE DO LIVRO DO FIM DA VIDA


O clube do livro do fim da vida, de Will Schwalbe, foi a leitura da semana. Trata-se de uma belíssima história de vida emoldurada por livros. 

Fascinante a ideia de contar parte de uma vida, de seus encontros e desencontros tendo como pano de fundo leituras. O que lemos é, além do que fazemos, parte de nossa marca no mundo. 

Um dia, espero, quando olharem minhas estantes dirão: ele leu isso, marcou tais passagens... é uma forma de eternizar-se. Schwalbe foi muito perspicaz ao relatar os últimos momentos de vida de sua mãe aliando lembranças, desejos, força de vontade e fé a passagens literárias marcantes que vão de autores clássicos como Charles Dickens a autores de livros contemporâneos de auto ajuda. 

O interessante é que não se percebe preconceito com este ou aquele autor, ou com este ou com aquele tipo de texto. Tudo é válido! Esse fato é admirável na obra! Fiz várias marcações de livros que quero conhecer, de pensamentos e reflexões e de lições que trago para minha vida. Vida que é breve e merece ser vivida da melhor forma possível. Mas não nego: é um livro que angustia em certos momentos. Pensar na não existência de quem amamos é um fardo. Mas, como diz Mary Anne, mãe de Schuralbe, tudo é parte da vida! 

Ao contrário do que muitos pensam, ler não nos afasta do convívio social, da vida real. Ler nos aproxima dela, da vida! Recomendo!

Meus abraços,
Wagner.

sábado, 9 de maio de 2015

O DIÁRIO DE ANNE FRANK

"Não quero que minha vida tenha passado em vão, como a da maioria das pessoas. Quero ser útil ou trazer alegria a todas as pessoas, mesmo àquelas que jamais conheci. Quero continuar vivendo depois da morte! E é por isso que agradeço a Deus por ter me dado esse dom, que posso usar para me desenvolver e para expressar tudo o que existe dentro de mim!" (Anne Frank)

E ela conseguiu! Continua viva! Eternizou-se através das palavras! Ela nos ajuda, ainda hoje, a repensar o holocausto e todo o cruel panorama da Segunda Guerra Mundial para que nunca nos esqueçamos do que houve, das atrocidades que o homem é capaz de cometer. Apenas relembrando, poderemos tentar fazer com que coisas do tipo não se repitam!

Muito já se escreveu sobre este livro que eu li há muitos anos e agora revisitei, numa edição linda de 2014, da Editora Record, aqui no Brasil. O livro é lindo. Um dos mais lindos de minha coleção: capa dura almofadada, com fotos e que imita o verdadeiro diário de Anne Frank. 

O que me fascina nessa obra é o posicionamento crítico e as visões emancipadas de mundo que uma menina, uma jovem de 13 anos é capaz de emitir. Seu diário nos mostra o que foi ser jovem, num ambiente de guerra, especialmente se esse jovem era judeu. 

Quando li pela primeira vez, fiquei muito angustiado, mas na última leitura, vi uma Anne Frank muito diferente! Sim, eu mudei com o passar dos anos e a leitura ganhou novo formato! Percebi uma Anne esperançosa, com sonhos, uma garota impetuosa, objetiva e forte, mesmo diante do peso da prisão em que viveu, escondida dos alemães! 

"Vejo o mundo se transformando aos poucos numa selva, ouço o trovão que se aproxima e que, um dia, irá nos destruir também, sinto o sofrimento de milhões. E, mesmo assim, quando olho para o céu, sinto de algum modo que tudo mudará para melhor, que a crueldade também terminará, que a paz e a tranquilidade voltarão. Enquanto isso, devo me agarrar aos meus ideais. Talvez chegue o dia em que eu possa realizá-los! (Anne Frank)

O texto é muito agradável. As cartas são curtas e o leitor sente desejo de acompanhar a próxima etapa, e a próxima, e a próxima... desvendando as transformações de uma menina em mulher, seus dramas vividos no isolamento de um anexo em Amsterdã, onde se escondeu por anos com mais sete pessoas, vivendo com restrições de todas as ordens.

Anne Frank, você vive! Leitura e escrita caminham juntas! 

Livro Recomendadíssimo!

Meus abraços,
Wagner Dias


sexta-feira, 1 de maio de 2015

A INSUSTENTÁVEL LEVEZA DO SER

Encerrei ontem a leitura de A Insustentável Leveza do ser, de Milan Kundera. Devido à correria da vida, precisei começar e recomeçar a leitura desta obra três vezes. Eu não conseguia me concentrar! Conseguida a proeza de entrar na obra, de estabelecer um contato íntimo com a mesma, a leitura fluiu docemente. Com absoluta certeza, este livro é um dos meus clássicos pessoais. Ficou e ficará marcado na alma. Eu diria que se trata de um soco no estômago no sentido de que, muitas das vezes, complicamos as coisas da vida, tornando pesadas as passagens leves e vice-versa! O livro, que se apoia em fatos históricos, tem uma estrutura narrativa genial! Não é uma leitura linear, faz idas e vindas do passado ao futuro, deste ao passado, com a narração de um observador atento e ciente de todos os elementos da vida dos personagens. Eu me enxerguei em muitas frases, parágrafos e passagens do livro. Não poderia ser diferente. Ele fala de vida! Mas as últimas partes da obra me tocaram profundamente, levando-me às lágrimas. É lindo! Surpreendente, desafiador! Para quem não tem muita experiência de leitura e deseja conhecer este livro, sugiro que não pare a leitura nos obstáculos que ela possa parecer oferecer. Siga em frente e deixe que as palavras os toquem. Elas farão isso! Fatalmente! Espero reler daqui a algum tempo e ver em que medida minhas visões se alteraram e de que modo serei tocado pelas palavras bem colocadas e sabiamente organizadas por Kundera neste manancial de possibilidades e interpretações que se chama A Insustentável Leveza do Ser!
A todos, meus abraços.
Wagner.