sábado, 8 de junho de 2019

TRILOGIA INVOLUNTÁRIA


Estou, há algumas semanas, mergulhado na literatura de Edney Silvestre. Cheguei à produção literária desse autor depois de ouvir comentários infindáveis sobre uma adaptação, para a televisão, de um de seus livros. Teimoso que sou, recusei-me a seguir a onda e decidi que começaria a conhecer o trabalho literário de Silvestre a partir de outro livro que não fosse o adaptado para a minissérie da TV Globo/Brasil.

Pois bem, comecei lendo Vidas provisórias, em seguida li A felicidade é fácil e, por fim, Se eu fechar os olhos agora. Descobri que fiz, despropositadamente, o caminho inverso. Li o que o próprio autor chama de trilogia involuntária, de trás para frente. Não que haja uma obrigatoriedade na ordem das leituras, uma vez que cada uma possui vida autônoma. No entanto, o conjunto da obra nos dá uma dimensão maior das histórias que, de um modo especial, se interligam! Não vou contar o porquê! Leiam os livros! ;-)

Os títulos das obras lidas são, em si, um convite à reflexão. O que estaria por trás de algo denominado Vidas Provisórias? São nossas vidas provisórias? O que é e como é viver uma vida provisória? Quantas vidas provisórias vivemos do nascer ao morrer? Esses elementos me tocaram profundamente, porque eu, viajante errante desde o ano de 2006, em busca de raízes e de um lugar para chamar de meu, tenho uma vida provisória. Não apenas uma vida: vivo várias e ambas são provisórias.  

O segundo: A Felicidade é Fácil. Outro título repleto de simbologias, de imagens, de metáforas...É fácil? Para quem? De que maneira? Se é fácil, por que complicamos e por que ela nos parece tão difícil, dura, complexa? É uma questão de saber olhar pela janela, como disse Cecília Meireles?

E se eu fechar os olhos agora? O que deixarei de ver? O que verei com os olhos da alma que se abrem quando os olhos, órgãos, se fecham? O que significa fechar os olhos para aqueles que nunca os abriram? Fechar os olhos é escuridão ou lampejo de cores, de luzes e de vida, que estão cravadas na nossa memória?

Essas foram minhas indagações nos momentos em que olhei para os títulos. Fiquei literalmente grudado às narrativas, à fluidez do textos, à linguagem repleta de nuances, de conhecimento de mundo. As entrelinhas mostram outros mundos, que vão da política, às artes, com uma destreza plena de quem nasceu para conviver com a palavra. 

Cada qual com sua trama, sua estrutura narrativa, sua voz narrativa, permite-nos uma viagem no tempo e no interior das nossas mais sublimes patifarias, mesquinharias, virtudes...

E se eu fosse um daqueles personagens? Saberia eu conceber que a felicidade é fácil? Talvez eu precisasse me perguntar: o que acontecerá se eu fechar meus olhos agora? Fechar! Esse fechar que pode ser voluntário ou involuntário, mas que nos dá a dimensão de que tudo é provisório. 

Para os que temem encontrar uma narrativa jornalística, posso afirmar que se trata de literatura, de excelente qualidade e que as pinceladas sobre política e história não são enfadonhas, nem tentam ser didáticas. Fatalmente o leitor encontrará um tipo de texto que fala com o público sem pretensões, mas que emociona. Emoção que perpassava pela dor, amor, ódio, nojo, pelo sexo... pelo sonho... pela sordidez... pela ternura... pela amizade... pelos dilemas que movem a humanidade. 

Eu, que sempre reclamo da produção literária contemporânea do Brasil, rendi-me às obras de
Silvestre! Seus livros não são construídos para vender. Mas vendem porque são bem construídos. Talvez o melhor sintoma de qualidade sejam as traduções para outros idiomas, o que fortalece a ideia de que a boa literatura alcança qualquer canto deste vasto mundo.  Sente-se a organização, o planejamento, a seleção do vocabulário, a preocupação com as camadas de textos que velam e desvelam fatos. Os livros não têm lacunas. Tudo está bem enredado! Eu diria que as cores, os sons, os cheiros, as luzes são organizadamente bem pensadas. 

O leitor é encaminhado sutilmente para o interior das histórias narradas e passa a fazer parte delas. Pelo menos essa é a minha sensação. Talvez pelo meu modelo de vida errante, o livro Vidas provisórias tenha me tocado mais profundamente, o que não significa que os outros não tenham encantos. Muito pelo contrário. Cada um aponta em uma direção, mas... como na vida, em algum lugar, ou de algum modo, essas direções se cruzam e nos dão a dimensão do que é ser humano. Somos Paulos, Eduardos, Bárbaras, Ubiratans, Aparecidas, Anitas... Somos presente, passado e futuro. 


Ler os livros de Silvestre é permitir-se abrir as cortinas da própria alma. Através de seus personagens, repensamos nossas angústias, nossas escolhas, nossas humanidades e desumanidades. 

A felicidade é fácil, quando aprendemos a fechar os olhos agora e entendemos que nossa passagem por este planeta é provisória. Sejamos intensos, na dor e no amor. 

Recomendo fortemente que os livros acima apontados sejam lidos. Não levem em consideração minha modesta apresentação. Eles são muito mais que isso! São de fato literatura, arte! E literatura, para mim, exige sensação, muito mais que entendimento. Garanto que vocês estarão bem acompanhados por essas obras!  

A todos, meus abraços!
Wagner Dias.


Um comentário:

  1. Aguça a nossa curiosidade... Abrir as cortinas da própria alma! Sentir que a felicidade é fácil... Fechar os olhos... E agora? Só lendo para saber. Obrigada, pelas dicas. Grande abraço. Lúcia Vasconcelos.

    ResponderExcluir